Inconstitucionalidades do Refis da Crise

A Lei nº 12.865, editada neste ano, abriu o prazo de adesão ao Refis da Crise, com asrefis_2011_01 alterações introduzidas pela Portaria Conjunta PGFN/RFB nº 11, de 22 de novembro, para as instituições financeiras e sociedades seguradoras liquidarem passivos de PIS e Cofins gerados até 31 de dezembro de 2012 e para as multinacionais que atuam no país regularizarem seus débitos de Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e CSLL, com fato gerador até 31 de dezembro do ano passado, no prazo máximo de 15 anos, com redução de juros e multas de até 50%. Há ainda a possibilidade de o contribuinte quitar parte dos débitos com prejuízos fiscais e bases negativas. Nos casos de pagamento à vista, as duas modalidades contemplam remissão de juros e multas isoladas. O prazo de adesão termina no dia 31.

Para as outras atividades empresariais, a lei reabriu o prazo do Refis da Crise de 2009. Mas ele só alcança raros casos de débitos vencidos até 30 de novembro de 2008, nunca parcelados, abarcando igualmente os débitos parcelados em outros programas – Refis 1, Paes e Paex. Aos excluídos, há expressa proibição de adesão. Por não haver estendido a flexibilidade nos pagamentos de débitos até dezembro de 2012, pouco ou nenhuma utilidade trouxe.

Segundo o jurista italiano Constantino Scalinici, o parcelamento fiscal é “instrumento conservativo do crédito e autotutela do Fisco e, sobretudo, um meio ágil de arrecadação de débitos tributários”. Esta atividade de arrecadação, como todo ato administrativo tributário, deve ser realizada com observância do princípio da igualdade, já que a lei, no estado de direito, exige que todos sejam onerados com a mesma intensidade, para que haja tratamento igual a todos.

A Lei do Refis da Crise não previu, como sanção, que os excluídos não poderiam participar de novos programas.

Menéndez Moreno e equipe dizem que “estes princípios da generalidade e igualdade comportam, negativamente, a ausência de privilégios ou discrimines em matéria fiscal. O que proíbe os princípios da generalidade e da igualdade é o estabelecimento de benefícios fiscais que constituam autênticos privilégios, isto é, normas excepcionais não justificadas com atenção aos critérios constitucionais”. Também a arrecadação é preordenada ao adimplemento da obrigação tributária e dirigida a assegurar o fluxo periódico e regular de recursos para que o Estado cumpra seus fins, necessitando de atual e segura capacidade contributiva dos contribuintes, de onde advirão esses pagamentos.

Pedro José Carrasco Parrilla explica que “o parcelamento da dívida tributária constitui medida excepcional para casos excepcionais. Se todos devem contribuir para o sustento dos gastos públicos conforme sua capacidade econômica, é de justiça que o credor tributário, em casos de necessidade, suavize a ação arrecadatória adaptando-a às disponibilidades dos contribuintes. Trata-se, por conseguinte, de flexibilizar as relações entre credor tributário e contribuintes em dificuldade transitória para o pagamento de tributo”.

Por outro lado, proibir os excluídos de voltarem ao Refis da Crise constitui sanção tributária com aplicação retroativa, instituída ao arrepio do artigo 5º, incisos XXXVI, XXXIX e XL da Carta Magna, uma vez que a lei que instituiu o programa (Medida Provisória nº 449, de 2008, convertida na Lei nº 11.941, de 2009) não previu, como sanção, que os devedores excluídos não poderiam, posteriormente, participar de novos parcelamentos. Segundo os professores Paulo José da Costa Jr. e Zelmo Denari “a exigência da lex praevia faz coro com o princípio insculpido no artigo 5º da Constituição Federal, ao enunciar que ‘não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal’, de inteira aplicação às sanções da ordem jurídica tributária”.

Como o parcelamento está sujeito ao princípio da igualdade e da capacidade contributiva, estaria de acordo com a Constituição o Refis da Crise abrir prazo para as instituições financeiras e proibir, por meio de sanção inconstitucional, os excluídos de optarem pelo plano novamente, justamente aqueles que enfrentam maiores dificuldades financeiras? Tendo em vista que o princípio da capacidade contributiva desvela que todos contribuirão conforme sua força e poder econômico, haveria obediência ao princípio conceder às instituições financeiras e multinacionais brasileiras a possibilidade de parcelar seus débitos até dezembro de 2012, enquanto as outras atividades econômicas estão limitadas a parcelá-los só até dezembro de 2008? E são tão poucos. Resolverá para tão poucos. Muito se deu para quem não precisava, enquanto à maioria devedora nada foi dado, além de inconstitucional castigo retroativo, pois, na realidade, nenhum prazo lhes foi reaberto.

Fonte: Valor Econômico

Via: Jornal Contábil