2016, um ano que deixará poucas saudades

Dilma caiu com o impeachment, e Eduardo Cunha está preso. Mas Michel Temer desapontou por sua imagem, agravada com o prosseguimento da recessão

O ano de 2016 foi aquele em que o Brasil mudou sua cara a uma velocidade vertiginosa.

Há exatamente um ano, a Presidência da República era ocupada por Dilma Vana Rousseff, e o político brasileiro mais poderoso era Eduardo Cunha, presidente da Câmara dos Deputados.

Dilma foi afastada pelo processo de impeachment em 11 de maio e perdeu definitivamente seu cargo com a votação do Senado em 31 de agosto.

Quanto a Eduardo Cunha, ele foi afastado do cargo em março e teve seu mandato cassado pelo plenário da Câmara em setembro.

Sem foro privilegiado, foi preso em outubro e é hoje hóspede do complexo penal de Pinhais, no Paraná.

A queda dos dois personagens não ocorreu por meio de uma conspiração de bastidores. Se o tão desprestigiado Congresso tomou as duas decisões, foi porque os cidadãos que queriam afastá-los ocuparam as ruas em manifestações mais intensas desde as Diretas-Já, de 1984.

Em março, na maior dos atos públicos, as polícias militares calcularam que 4,5 milhões de partidários do impeachment se manifestaram em mais de 300 cidades.

Os atos pró-Dilma também foram volumosos, mas atraíram uma quantidade bem menor de manifestantes.

Cunha teve um papel importante no afastamento de Dilma. Foi ele quem desencadeou o processo, em dezembro de 2015, e seguiu, nas votações seguintes, as determinações do Supremo Tribunal Federal (STF).

Mas sua reputação estava tão comprometida quanto a de seus ex-aliados petistas, também envolvidos na Lava Jato. Entre uns e outros, o chamado “ronco das ruas” acabou por defenestrar todos eles.

Este ano foi também marcado pela descoberta detalhada das operações de sangria da Petrobras.

Os números maiores e mais confiáveis foram divulgados agora em dezembro, com o acordo de leniência da Odebrecht no Brasil, Estados Unidos e Suíça.

Somente na corrupção de políticos brasileiros a empreiteira gastou R$ 1,9 bilhão, somado aos R$ 289 milhões da Braskem, seu braço petroquímico.

Não se tem ainda a totalização de outras empreiteiras, como a OAS, a Queiroz Galvão ou a Mendes Júnior.

A IMENSA ENERGIA DA LAVA JATO

Na outra ponta, as investigações da Lava Jato afetaram o PP e o PMDB, mas sobretudo o PT, pelo papel central na compra de apoio parlamentar, por meio de desvios em estatais.

Os números provisórios do Ministério Público Federal e da primeira instância de Curitiba são impressionantes.

Foram 1.434 procedimentos instaurados, com 79 prisões preventivas e 103 prisões provisórias, 730 mandatos de buscas e apreensões e 120 condenados.

Antes da equipe de 77 executivos da Odebrecht, as delações premiadas já eram 71. A mais bombástica será a de Marcelo Odebrecht, ex-presidente da empreiteira.

E a que provocou maiores estragos políticos foi a do ex-senador petista Delcídio do Amaral.

Ex-diretor da Petrobras, ele implicou Dilma na compra da refinaria de Pasadena (Texas), que causou prejuízo de US$ 792 milhões à estatal, segundo o Tribunal de Contas da União (TCU).

Delcídio também confessou ter sido o interlocutor de operações de obstrução de Justiça, patrocinadas por Dilma e Lula.

O ex-presidente termina o ano como réu em cinco processos, dois deles não instruídos em Curitiba por Sérgio Moro.

O juiz é acusado pelos partidários de Lula de comandar uma conspiração cujo objetivo é uma condenação à prisão que tiraria os direitos políticos do ex-presidente petista.

Com a popularidade no chão, sobretudo depois do pífio desempenho do PT nas últimas eleições municipais (256 prefeituras, em lugar das 630 em 2012), Lula voltou a ser politicamente viável, de acordo com a pesquisa Datafolha publicada agora em dezembro.

Derrotaria Aécio, Serra e Alckmin, no segundo turno presidencial de 2018, e só perderia para Marina Silva.

A BOA VONTADE E A FRAQUEZA DE TEMER

Esse desempenho se justifica sobretudo pelo efeito de contraste com o presidente Michel Temer. A sociedade esperava de Temer resultados imediatos contra a recessão.

O desemprego no terceiro trimestre continuou a subir e chegou a 11,8%, o PIB terá queda ainda no início de 2017, segundo previsão do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, e apesar da inflação ter caído de 10,7% para pouco mais de 6,5%, a taxa Selic está em 13,75%, só um pouco menor que os 14,25% do início do ano.

O que faltou então ao governo Temer? Sua imagem traz elementos misturados.

Tem o apoio incontestável no Congresso? Sim, porque conseguiu a aprovação da PEC que limita os gastos públicos. Não, porque o projeto que favorece a dívida dos Estados só passou depois da poda das contrapartidas fiscais que o Planalto exigia.

Essa última votação é um mau agouro com relação à primeira discussão importante de 2017, que será a reforma da Previdência, que contraria os interesses paroquiais de deputados e senadores.

O fato é que Temer não demonstrou ser um grande estadista que, ainda por efeito de contraste, esperava-se de um sucessor da fraquíssima Dilma Rousseff.

Além da ficha judicial daqueles que o cercavam de início – Renan Calheiros, Romero Jucá, Eliseu Padilha, Henrique Eduardo Alves – foi lamentável a sua atuação no episódio de Geddel Vieira Lima.

Para não machucar o aliado, Temer acabou comprometendo o Planalto na tentativa do ex-ministro de manter vantagem pessoal no controvertido empreendimento imobiliário da cidade de Salvador.

Temer tem ainda sua fraqueza pendurada nos desdobramentos ainda desconhecidos da Lava Jato e no julgamento em 2017, pelo Superior Tribunal Eleitoral (TSE), do processo em que ele e Dilma são acusados de financiar a campanha de 2014 com dinheiro desviado da Petrobras.

Impopular, o presidente da República não chega, no entanto, a provocar saudades dos 13 anos de governo do PT.

Ele é um personagem menos robusto -o único de que o país dispunha para essa transição de 29 meses, até a posse de um novo presidente da República, em 1º de janeiro de 2019.

Enquanto isso, o Brasil repete algo que se transformou em chavão. Com todos os tropeços, 2016 é um ano que faria pouca falta se não existisse no calendário da recente história republicana.

Fonte: Diário do Comércio

2 thoughts on “2016, um ano que deixará poucas saudades

  1. Parabéns pelo artigo, conseguiu sintetizar bem o que foi esse fatídico ano. Porém somente não concordo com um ponto. A existência de 2016 foi importantíssima, dura, porém necessária. É mais ou menos como aqueles castigos que nossa mãe nos dava, quando crianças, para aprendermos uma lição. Era duro, sofrido, e parecia injusto. Como adultos agora, percebemos o quão importante foi. Da mesma forma 2016 (e 2015 também) devem ser encarados como um período de “castigo”, ou melhor ainda, de profilaxia (gosto dessa palavra). Isso tornará nosso país mais adulto, calejado, maduro. Espero que desse processo de limpeza sobrem somente aqueles que realmente fazem bem para a sociedade, não buscando interesse próprios, mas sim coletivos. Em tempo: Não sou partidário. Não sou socialista. Sou somente mais um brasileiro pagador de impostos.

    1. Prezado Renato,
      Esta matéria apenas foi reproduzida em nosso blog. Os créditos são do Diário do Comércio – SP.
      Acreditamos que seja importante termos estas publicações no Blog, com opiniões e informações sobre a macroeconomia do país.
      Obrigado pelo seu comentário e aguardamos suas visitas e posicionamentos.

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