Carf julga autuação de R$ 1,1 bi da Ambev

A Ambev está a um passo de afastar, no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), a maior parte de uma autuação bilionária sobre tributação de lucros de controladas no exterior. Em julgamento realizado ontem, os conselheiros da 2ª Turma da 3ª Câmara da 1ª Seção votaram de forma parcialmente favorável à companhia. Mas não proclamaram o resultado.

A sessão foi suspensa para análise de pedido da Ambev. A companhia quer compensar a parte que perdeu, referente a uma controlada na Argentina, com valores de impostos recolhidos naquele país. Os conselheiros decidiram verificar a documentação apresentada que comprovaria os recolhimentos.

Esse é o menor pedaço da autuação de R$ 1,1 bilhão, que cobra Imposto de Renda (IRPJ) e CSLL. A maior parte do processo (nº 16561.720111/2017-77) refere-se à tributação de lucro de controlada em Luxemburgo, que foi afastada na primeira instância da esfera administrativa. A questão foi levada ao Carf por meio de recurso da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN).

O processo da Ambev é um dos poucos no Carf com indicação de decisão parcialmente favorável. Desde a reformulação do órgão, em 2015, prevalecem decisões contrárias aos contribuintes. Foram julgados 45 processos envolvendo a matéria “lucros no exterior e aplicação dos tratados” nas turmas ordinárias e na Câmara Superior. Em 40 julgados, segundo a PGFN, prevaleceu a tese da Fazenda Nacional.

No caso em análise na 2ª Turma da 3ª Câmara da 1ª Seção, a Ambev está prestes a conseguir afastar boa parte da autuação, referente à tributação de lucro da controlada em Luxemburgo, que tem origem na união entre os grupos Ambev e Interbrew.

A união resultou em mudança na estrutura societária da Interbrew, gerando ágio intragrupo que teve como fundamento a reavaliação da cervejaria Labatt Canadá. A empresa foi incorporada pela Labatt Dinamarca, com registro de ágio de R$ 16 bilhões em junho de 2004.

Em 2010, a Labatt Dinamarca passou a ser controlada pela Ambev em Luxemburgo. Com a mudança, o ágio passou a ser aproveitado em Luxemburgo, reduzindo o lucro que a controlada reportava para tributação no Brasil – o motivo para a autuação.

Em sustentação oral, o procurador Rodrigo Moreira, da Fazenda Nacional, afirmou que a reorganização interna foi realizada para “matar o ágio interno” no exterior e reduzir o valor a ser tributado no Brasil. “A Interbrew passou a ser acionista da Ambev. Ela está sendo beneficiada pela amortização de ágio”, disse.

Já o advogado da Ambev, Ricardo Krakowiak afirmou que, como a Labatt Dinamarca registrou ágio de R$ 16 bilhões, a Ambev, ao incorporá-la, não registrou o ágio no Brasil. “Não foi do interesse da Ambev. Para a companhia foi prejudicial. Eles queriam o ágio aqui no Brasil”, disse.

No exterior, acrescentou o advogado, a amortização é realizada em 20 anos. No Brasil, seria em cinco. “Não há acusação de que a reorganização societária seja fraudulenta. Ela ocorreu de fato”, afirmou Krakowiak.

Em seu voto, o relator, conselheiro Flávio Machado Vilhena Dias, representante dos contribuintes, negou o pedido da PGFN e foi acompanhado por todos os julgadores. Porém, na parte relativa à controlada na Argentina, ficou vencido. Essa votação ficou registrada em ata. Portanto, deverá ser mantida quando o julgamento for retomado.

Na Justiça, há precedente favorável aos contribuintes, segundo Diogo Figueiredo, sócio do Schneider Pugliese Advogados. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) já julgou o assunto e se posicionou contra a tributação. “A princípio, por se tratar de matéria infraconstitucional, não deveria ser julgado pelo Supremo Tribunal Federal (STF)”, afirmou.

A maioria dos processos sobre o assunto, acrescentou o advogado, envolve a MP 2.158-35/2001. A norma determina que, se houver lucro apurado em controlada, terá que ser reconhecido no Brasil. A dúvida, de acordo com Figueiredo, surge nos casos em que as empresas localizam-se em países com os quais o Brasil tem acordo para evitar a bitributação. Geralmente, os tratados determinam a tributação no exterior.

Fonte: Valor Econômico