Pagar tributos custa à indústria R$ 24,6 bi

Valor equivale ao dobro do que empresas investiram em inovação e a 10% da folha de pagamentos em 2012

Estudo inédito levantou dados de 1.180 firmas no país; em média, cumprir burocracia exige equipe de 10 funcionários

CLAUDIA ROLLI
DE SÃO PAULO

A indústria de transformação gastou R$ 24,6 bilhões somente com burocracia para pagar tributos no ano passado, valor que representa 10% da folha de pagamento do setor e o dobro do que ele investiu em pesquisa, desenvolvimento e inovação.

Isso equivale a dizer que, para cada R$ 1.000 desembolsados no pagamento de impostos, a indústria gastou mais R$ 64,90 em burocracia.

“É um dinheiro perdido que vai para o ralo”, diz José Ricardo Roriz Coelho, diretor do departamento de competitividade e tecnologia da Fiesp (federação da indústrias paulistas).

“Em vez de investir em tecnologia para tornar a produção mais eficiente e entregar ao consumidor um produto melhor e mais barato, o empresário é obrigado a gastar com a burocracia tributária.”

Os custos diretos e indiretos da burocracia representam 2,6% do preço final dos produtos, considerado o efeito cascata na cadeia produtiva do pagamento de tributos desde a compra de insumos.

Os dados que mensuram o custo na indústria em nível nacional, obtidos pela Folha com exclusividade, serão apresentados amanhã em seminário em São Paulo.

O objetivo é discutir com os fiscos (estadual e federal) como simplificar o sistema, evitar o excesso de normas e reduzir o número de tributos.

Para calcular o custo total gasto com pagamento de impostos, o levantamento considerou uma amostra representativa do setor, com 1.180 indústrias de todos os portes.

Dos R$ 24,6 bilhões, a maior parte foi para pagar funcionários e gestores ligados à área tributária: R$ 16,3 bilhões. Em média, as empresas alocam dez pessoas para cuidar de atividades ligadas à tributação, incluindo pagamentos fiscais, encargos sobre a folha de pagamento ou de contabilidade.

Os gastos com instalação e operacionalização de softwares, obrigações acessórias (livros, registros e armazenamento de dados) e terceirização de serviços fiscais somaram R$ 6,5 bilhões. Os custos judiciais das empresas foram de R$ 1,8 bilhão.

Augusto Boccia, dono da indústria São Rafael, fabricante de câmaras frigoríficas há 39 anos no Arujá (SP), diz que, depois de idas e vindas, terceirizou a contabilidade e criou uma equipe interna para conseguir cumprir o emaranhado de leis e regras.

“É impossível manter-se atualizado e conseguir entender toda a legislação. Gasto em média R$ 50 mil por mês com cumprimento da parte fiscal e contábil. Do meu faturamento anual, isso representa 2,25%”, diz.

Segundo o Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação, 30 novas normas tributárias são editadas por dia no Brasil, o equivalente a 1,25 por hora.

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PESADELO FISCAL

Burocracia afeta mais a receita da pequena indústria.

Mesmo em regime simplificado, menores têm de contratar serviço especializado; peso na receita é o dobro da média.

PIS, Cofins e ICMS lideram ranking de dificuldades para empresários cumprir exigências tributárias.

DE SÃO PAULO

As indústrias de pequeno porte do setor de transformação são as que mais sofrem o impacto dos custos administrativos e burocráticos para pagar tributos no país.

Enquanto na média o gasto com burocracia equivale a 1,16% da receita das empresas, entre as pequenas, o percentual chega a 3,13%, segundo levantamento nacional feito pela Fiesp (federação de indústrias paulistas).

Do total de R$ 24,6 bilhões gastos para cumprir as exigências tributárias, R$ 6 bilhões saíram do caixa das pequenas. O gasto das médias foi de R$ 5 bilhões (1,64% do que faturaram) e os das grandes, R$ 13,6 bilhões (0,83% da receita).

Apesar de o volume de gastos ser maior, as empresas de grande porte conseguem contratar funcionários especializados para a área fiscal, e, com volume mais elevado de vendas, diluem os custos, diz o advogado Jorge Henrique Zaninetti, tributarista do Siqueira Castro Advogados.

MENOS INVESTIMENTOS

“As pequenas e as médias, mesmo quando optam por regimes tributários menos complexos (como lucro presumido e Simples) têm de cumprir exigências que não dispensam a contratação de pessoal especializado ou serviços de terceiros”, diz o empresário Denis Perez Martins, dono da Poly Hidrometalúrgica, fabricante de pequeno porte de metais sanitários.

A empresa gasta por mês R$ 6.000 em salários e manutenção de sistemas para conseguir atualizar softwares que permitem cumprir as obrigações fiscais e contábeis.

“Há cinco anos fiz meu último investimento na produção, comprando uma máquina. Não sobram recursos”, afirma o empresário.

Advogados e especialistas em tributação informam que PIS, Cofins e ICMS lideram o ranking de reclamações dos empresários, por causa das constantes mudanças na lei e da burocracia exigida para entender as regras. (CR)

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ANÁLISE

Custo afasta investidores e tendência é ficar ainda mais alto

MARCOS CÉZARI

COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Burocracia atrai burocracia, que atrai burocracia, que eleva os custos para as empresas. Isso acontece no Brasil devido à parafernália tributária/fiscal excessiva, que, no geral, mais complica do que simplifica.

O estudo da Fiesp é uma prova de que algo está errado no sistema fiscal e contábil do país. Mudar isso é fundamental para atrair investimentos estrangeiros.

Nenhum investidor se sente atraído por um país que, além de cobrar muito, complica para pagar.

O sistema tributário brasileiro apresenta problemas devido ao excesso e à complexidade das normas e ao elevado número de tributos. O resultado é que as empresas têm de deslocar para a atividade administrativa recursos que poderiam e deveriam ser usados na produtiva.

O presidente do Sescon/SP (sindicato que reúne as empresas de serviços contábeis do Estado), Sérgio Approbato Machado Júnior, diz que o sistema tributário/fiscal do país é tão complexo que “a maioria das empresas não tem condições financeiras para atender às necessidades do fisco”.

Para Machado, “mudar a estrutura atual exige um projeto de governo, e não apenas um programa da Receita”. Um exemplo de como a Receita complica é a instrução normativa nº 1.397, publicada na semana passada e que trata da adoção, no Brasil, do padrão contábil internacional (IFRS, na sigla em inglês).

Essa instrução mantém um regime transitório de escrituração contábil, existente há mais de cinco anos, adiando a implantação de uma regra definitiva. A partir de 2014, passará a ser obrigatória a geração de duas escriturações contábeis: uma com base nas normas hoje em vigor e outra, para efeitos fiscais, com base nas normas contábeis de 31 de dezembro de 2007. Resultado: mais custo.

Tudo indica que, mesmo com os avanços tecnológicos de um sistema como o Sped (Sistema Público de Escrituração Digital), nos próximos anos o custo adicional constatado pela Fiesp deverá ficar mais próximo de R$ 7 do que de R$ 6 para cada R$ 100 pagos em tributos.

Fonte: Folha de S.Paulo

Via: http://www.fenacon.org.br/noticias-completas/1390