Especialistas apontam mudança em aplicação da lei tributária com MP

A Medida Provisória 881/2019, chamada MP da Liberdade Econômica, interfere no direito tributário, mesmo que de forma indireta. O texto, assinado no final de abril pelo presidente Jair Bolsonaro, estabelece normas de proteção à livre iniciativa e ao livre exercício de atividade econômica.

A MP chega a explicitar que algumas de suas disposições não se aplicam ao direito tributário. Mas, segundo o mestre em direito tributário pela Universidade de São Paulo (USP) e sócio do Maneira Advogados, Pedro Ribas, ao modificar partes do direito civil que influenciam a parte tributária, a medida provisória muda a aplicação da lei tributária.

“A MP não foi concebida para o direito tributário, mas altera dispositivos legais que acabam interferindo em pontos da lei tributária”, explica.

Ribas foi um dos palestrantes do Seminário Impactos da MP da Liberdade Econômica no Direito Tributário, ocorrido na quarta-feira (19), em Belo Horizonte. O encontro foi realizado pelo Instituto Mineiro de Direito Tributário (IMDT) e Conselho Regional de Contabilidade de Minas Gerais (CRC-MG).

Ambiente de negócios – Ele considera que o texto é positivo e busca melhorar o ambiente de negócios no País. A MP, por exemplo, tem entre seus três princípios norteadores a presunção de boa-fé do particular. Com isso, qualquer dúvida na interpretação no direito deve ser resolvida no sentido que mais respeita os contratos e atos privados, o que pode levar ao aumento da segurança jurídica.

“O texto mostra que o governo quer confiar no contribuinte, deixando de ser um entrave para a iniciativa privada”, disse. Os outros dois princípios norteadores do texto são o livre exercício de atividades econômicas e intervenção mínima do Estado na economia.

Por enquanto, segundo Ribas, é difícil falar em impactos práticos da MP. Isso porque a norma traz um novo tipo de raciocínio, reforçando que o poder público deve agir como parceiro – e não dificultador – da iniciativa privada. Entretanto, o texto não tem comandos claros sobre como isso vai acontecer. Essa característica, de trazer termos amplos, também pode dificultar a concretização de um dos objetivos da medida, que é aumentar a segurança jurídica.

Ainda segundo Pedro Ribas, a MP traz pontos já previstos na Constituição, como a boa-fé com o particular, livre iniciativa e intervenção mínima do Estado na economia. Ele pondera, no entanto, que foi necessário reforçá-los, pois, de alguma forma, não vinham sendo observados.

Presidente do IMDT e sócio no William Freire Advogados, Paulo Honório de Castro Júnior considera que o momento atual do País, com mudança de governo e políticas econômicas, vem demandando bastante dos profissionais do direito tributário. Ele explica que o direito tributário é um instrumento muito utilizado por governos para concretizar políticas econômicas, especialmente em momentos de crise. E são medidas com repercussões perante o contribuinte.

“É um momento complexo, que demanda diálogo com profissionais do direito e com entidades que também atuam na área”, disse.

Na avaliação de Castro Júnior, a MP da Liberdade Econômica é positiva e trará melhorias para o ambiente de negócios, dando mais segurança jurídica e previsibilidade aos negócios.

Também palestraram no seminário a mestre em direito tributário pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e conselheira titular do Conselho de Administração de Recursos Fiscais (Carf), Júnia Gouveia, o procurador da Fazenda Nacional, Rafael Amaral dos Santos, e o diretor do IMDT e supervisor de tax no William Freire Advogados, João Paulo Ayres.

Análise de impactos passa a ser obrigatória

A avaliação sobre os impactos trazidos por medidas de órgãos e entidades federais de interesse dos agentes econômicos – como alteração em determinados impostos – passa a ser obrigatória em alguns casos, conforme estipula a MP da Liberdade Econômica. Segundo o mestre em direito tributário pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Alessandro Mendes Cardoso, esse tipo de avaliação vem sendo feito por algumas entidades, mas como forma de boas práticas de gestão e não por determinação legal.

Alessandro Cardoso – que também é doutorando pela PUC Minas e sócio do Rolim, Viotti e Leite Campos Advogados – considera que esse é um ponto muito positivo da MP, restando saber como será, de fato, a sua implementação.

O artigo 5º da MP diz que as alterações de atos normativos de interesse geral de agentes econômicos ou de usuários dos serviços prestados, editadas por órgãos ou entidades federais, “serão precedidas da realização de análise de impacto regulatório, que conterá informações e dados sobre os possíveis efeitos do ato normativo para verificar a razoabilidade do seu impacto econômico”.

Essa medida vale, por exemplo, para mudanças em impostos extrafiscais, como os de importação e exportação e IPI. Exemplo disso ocorreu no domingo, quando o presidente Jair Bolsonaro informou que o governo federal analisa reduzir de 16% para 4% os impostos sobre importação de produtos de tecnologia da informação. Entidades empresariais do setor consideram que a medida pode prejudicar a indústria nacional, gerando desemprego.

Pelas novas regras da MP, a mudança só poderá ocorrer se vier acompanhada da análise de impacto. Na opinião de Cardoso, essa prática deveria ser ampliada para as esferas públicas estadual e municipal, devendo também ser aplicada no caso de concessão de benefícios fiscais.

Fonte: Diário do Comércio – Minas Gerais