Supremo resguarda os contribuintes quanto ao ressarcimento do ICMS-ST
Por Daniella Zagari, Camila Galvão, Juliana Caleiro e Harone Prates Vilas Boas
A substituição tributária, prevista na Constituição Federal, possibilitou que os Estados arrecadassem o ICMS de maneira muito mais eficiente. Na prática, o que se faz é antecipar o fato gerador do ICMS, a venda ao consumidor final, elegendo um responsável pelo pagamento do imposto que incidirá sobre uma base de cálculo presumida. A Constituição prevê uma hipótese de ressarcimento: quando não ocorrer o fato gerador que se antecipou. Essa ficção jurídica que facilita a arrecadação e fiscalização do ICMS, contudo, pode gerar distorções.
A base de cálculo presumida é fixada por meio de preços finais/margens divulgados pelos estados. Por mais que se busque a perfeita coincidência da presunção com a realidade, na prática, muitos dos preços presumidos são superiores ao valor da venda efetiva, e há também situações em que a venda se realiza por valor superior.
Até o julgamento ocorrido no último dia 19 de outubro deste ano, o STF tinha o entendimento de que a base de cálculo e o fato gerador presumidos no regime de ICMS-ST eram definitivos, e que não comportavam nem restituição nem complementação, sendo a única exceção a hipótese de não concretização do fato gerador (decisão proferida no julgamento da ADI 1.851/AL em 2002).
Segundo a Suprema Corte no julgamento dessa ADI, a substituição tributária no ICMS partia justamente da premissa de uma ficção para se antecipar o imposto, portanto, não faria sentido buscar ressarcimento ou complemento do imposto com base na operação real, porque estar-se-ia inviabilizado o próprio instituto da substituição tributária, que parte de uma presunção.
Contudo, o STF alterou seu entendimento no julgamento do Recurso Extraordinário 593.849. Na mesma oportunidade, julgou improcedentes as ADIs 2.777 e 2.675 por entender constitucional a previsão estadual de ressarcimento do ICMS-ST.
O STF entendeu que é cabível o ressarcimento do imposto pago em regime de substituição tributária na hipótese de a venda efetiva se dar em valor inferior à base de cálculo presumida do imposto. Essa decisão, ainda não publicada, foi submetida ao regime da repercussão geral, isto é, o poder judiciário e a administração deverão observar o posicionamento da Suprema Corte sobre o tema.
O fundamento central das decisões que prevaleceram foi no sentido de que a eficiência fiscal não poderia se sobrepor à vedação ao confisco, e que a simplificação da arrecadação não poderia deixar em segundo plano os direitos e as garantias dos contribuintes. Mencionou-se também que a Constituição Federal prevê o ressarcimento do ICMS-ST no caso de não realização do fato gerador presumido e que a venda por valor inferior seria uma espécie de não-realização do que se presumiu.
A Suprema Corte modulou os efeitos de sua decisão, isto é, determinou que esse novo entendimento seja aplicado aos fatos posteriores à proclamação do resultado de julgamento, assim como a todos os processos já ajuizados, inclusive os que estão com recursos sobrestados.
De agora em diante, os contribuintes terão fundamento constitucional para requerer o ressarcimento do ICMS-ST na hipótese de venda em valor inferior do que a operação presumida, inclusive naqueles rstados em que não há previsão nesse sentido.
A decisão do Supremo também vem em reforço aos contribuintes que estão discutindo administrativa e judicialmente o direito ao ressarcimento de ICMS-ST naqueles estados que já preveem o ressarcimento. E esse reforço decorre do entendimento de que esse direito está constitucionalmente garantido e não poderia ser obstado por parte das Secretarias de Fazenda, com a imposição de obrigações acessórias que inviabilizem o ressarcimento.
Um aspecto que não foi diretamente abordado na decisão do STF diz respeito à situação dos contribuintes que questionam a cobrança do complemento do ICMS-ST pelos Estados em função de a venda ter se dado em valor superior à base presumida. O entendimento do STF de que a base de cálculo presumida no ICMS-ST não é definitiva, poderia, em tese, impactar as discussões sobre a cobrança do complemento do ICMS-ST pelos estados.
Mas alguns pontos devem ser ponderados. Em primeiro lugar, o complemento do ICMS-ST somente poderá ser cobrado na hipótese de haver previsão legal para tanto. Em segundo lugar, a cobrança do complemento após a realização da venda poderia ser questionada inclusive sob a perspectiva constitucional, porque a Constituição Federal prevê apenas a hipótese de ressarcimento com a não realização do fato gerador do ICMS-ST, preservando a lógica intrínseca do ICMS, que é imposto indireto cujo ônus é repassado ao consumidor final. E a cobrança do complemento após a venda, além de não prevista na Constituição Federal, inviabiliza o repasse desse ônus.
Por fim, é muito importante que seja resguardada a segurança jurídica daqueles contribuintes que questionam a cobrança do complemento do ICMS-ST porque pautaram seu comportamento no entendimento até então consolidado no STF, no sentido de que a tributação no regime de substituição tributária era definitiva. Esses contribuintes que se insurgiram contra a cobrança do complemento do ICMS-ST valendo-se do entendimento anterior do STF deverão ficar resguardados, justamente para se preservar a segurança jurídica.
Fonte: ConJur
2 thoughts on “Supremo resguarda os contribuintes quanto ao ressarcimento do ICMS-ST”
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É quase um retorno ao ICMS normal. Outro ponto, considerando a falta de caixa dos Estados, podemos nos preparar para um “contra ataque” ou via aumento das MVAs para cálculo do ST ou via cobrança de ICMS nas vendas realizadas com margens superiores a presumida (algo que ainda não está descartado).
Prezado Marcos,
É quase, não fosse a tão famigerada demonstração da base de ressarcimento. No mais passou a ser um adiantamento, pois cabe o ressarcimento se aplicado em excesso. Para os caixas apertados do Estados pode ser um alívio passageiro, mas para o contribuinte